Publicado por: fgalvao | Dezembro 19, 2007

“Somos todos filósofos?”

Por: Filipe M. Menezes em Via Filosofia

Esta pergunta exige duas respostas contrárias – mas não contraditórias.

A) Não. A Filosofia não se confunde com o senso-comum. Há nela uma exigência de rigor, de coerência e consistência que não está presente nos saberes adquiridos ou construídos de forma mais ou menos espontânea, naqueles que decorrem das experiências vividas e são acumulados ao longo da vida ou foram-no no decurso de gerações. O filósofo conhece, em geral, a História das Ideias e dialoga com os pensadores do seu tempo e de outrora, o seu pensamento integra uma longa tradição (mesmo quando se lhe opõe) quanto aos problemas de que trata e quanto ao modo como os trata; assim, a sua maneira de ver o mundo resulta de um trabalho sistemático e exaustivo, levado a cabo ao longo de quase toda a sua vida. Muito mais haveria a assinalar acerca do trabalho do filósofo, mas o que já foi dito basta para perceber que a maioria das pessoas não podem ser consideradas filósofas neste sentido.

B) Sim. Reunidas todas as condições capazes de assegurar a sobrevivência e algum bem-estar, todos os seres humanos capazes de pensar são também potencialmente capazes de filosofar. Normalmente, são as chamadas “experiências de contraste” – aquelas das quais resulta o espanto, a admiração ou a surpresa – que estão na origem do filosofar a que se costuma chamar “espontâneo”. Deste tipo de filosofar nem sempre têm consciência as pessoas que o levam a cabo. Não é preciso sequer ter ouvido falar de Filosofia para se ser capaz de filosofar neste sentido. O filosofar de que agora se fala manifesta-se muitas vezes na forma de perguntas, exclamações ou afirmações que, nas condições referidas acima, podem surgir em diferentes momentos da vida, não apenas momentos de tristeza ou desespero, mas também em situações de grande felicidade, em confronto com algo belo ou bom. Por estranho que pareça, são frequentes manifestações desta natureza provindas de adolescentes e mesmo crianças. Outras vezes, provêm de gente humilde e sem estudos. Verdade seja dita que sem esta forma de filosofar espontaneamente nunca a Filosofia propriamente dita teria surgido na História da Humanidade. O problema é que a maior parte das pessoas não está preparada para reconhecer o carácter filosófico das suas próprias intuições ou para lidar com as suas preocupações filosóficas.

Visto que seria uma utopia admitir que um dia todos pudessem desenvolver os seus estudos de Filosofia numa Academia, há que procurar outras formas de munir-se de ferramentas adequadas ao tratamento das questões filosóficas vividas na primeira pessoa. A chamada Filosofia Aplicada procura criar caminhos que propiciem o desenvolvimento de competências de reflexão crítica e filosófica. Um desses caminhos é o Aconselhamento Filosófico, no qual aquilo que a pessoa encontra é alguém que se dispõe a contribuir para o aperfeiçoamento e aprofundamento da capacidade de examinar a própria vida à luz da Razão.

Filipe M. Menezes


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